Star Wars é muito ruim
Nasci em 1983, portanto não assisti a trilogia original no cinema. Mesmo assim, Guerra nas Estrelas (transformado depois em Episódio IV: A Nova Esperança), O Império Contra-Ataca e O Retorno de Jedi foram filmes que fizeram parte da minha infância e adolescência. Até hoje gosto deles, em parte pelo valor sentimental, em parte porque são bons filmes dentro daquilo que se propõem a ser: space opera ou space fantasy. Dentro do gênero de fantasia (o espaço e as naves ali pouco tem a ver com ficção científica), a trilogia original tornou-se icônica. Nem mesmo o universo expandido criado depois dos primeiros três filmes—incluindo a trilogia do Anakin e a trilogia nova, que acaba de se encerrar—foi capaz de gerar personagens tão icônicos quanto Luke Skywalker, Darth Vader, Han Solo e princesa Leia, fora a miríade de personagens secundários, como Chewbacca, R2D2 e C3PO.
O único dos originais que vi no cinema foi O Retorno de Jedi, na década de 1990, durante os relançamentos planejados para antes da estréia do Episódio I: A Ameaça Fantasma. Esse último, lançado em 1999, foi o primeiro filme da trilogia prequel, a saga de filmes que explicaria os eventos que levaram o jovem Anakin Skywalker a se tornar Darth Vader. Na época, gostei da Ameaça Fantasma e dos dois filmes subsequentes. Porém, nos anos seguintes fui gostando cada vez menos deles, até o momento que passei a detestá-los como abominações cinematográficas atrozes. Esse sentimento ainda continua: o trilogia do Anakin é uma abominação cinematográfica.
Ficou claro que a Lucasfilm, sob o comando da produtora Kathleen Kennedy, não traçou um plano para a trilogia. Cada filme teria um diretor e um roteirista próprio. O segundo filme foi dirigido e escrito por Rian Johnson. Antes de ver Os Últimos Jedi, assisti apenas um filme de Johnson chamado Looper, e gostei. Não é a melhor coisa do universo, mas é uma ficção científica divertida. Mas o Star Wars que Johnson fez simplesmente descarrilhou quase tudo o que fora deixado no ar pelo primeiro filme da nova trilogia. Muitas das críticas feitas na época, que reverberam até hoje, falam que Johnson profanou a história da saga. Johnson teria profanado principalmente a história do grande paladino, Luke Skywalker, que em Os Últimos Jedi tornou-se num velho amargurado que acredita que os Jedi têm que acabar para a Força entrar em real equilíbrio.
Apesar do chororô de muitos, essa foi a melhor parte do filme para mim. Aliás, achei toda a subversão da questão feita pelo roteiro de Rian Johnson maravilhosa... Até chegarmos ao final do filme, em que ele faz com que os personagens retornem à estaca zero: os bonzinhos voltam a ser bonzinhos, incluindo Luke, enquanto que os malvados continuam malvados. Passamos um filme todo assistindo a possibilidade de Jedi e Sith (inimigos históricos dos Jedi) estarem errados na sua eterna luta, que talvez fosse hora de um lado "cinza" da Força, apenas para no final nada disso acontecer. No final do filme, um dos vilões da nova saga, Kylo, mata o vilão-mor, Snoke, e propõe uma aliança com a mocinha, Rey. O problema, para mim, foi que tal aliança não se deu. E pior ainda: no final, Luke Skywalker se sacrifica, afirmando que não será o último Jedi, dando a entender que teve uma mudança completa em seu pensamento. Saí desapontado.
Os Últimos Jedi não subverteu nada. Quer dizer: ele fez um gracejo, fingiu que subverteria durante uma hora e meia, apenas para no final voltar a mesma coisa de antes—menos o vilão-mor, Snoke, agora morto. Chegamos então ao filme atual, um fracasso de crítica e de bilheteria—quer dizer, fracasso dentro dos padrões de filmes dessa franquia. Não assisti o filme, nem pretendo, mas li o script. É muito ruim. Inicialmente, a Disney contratou um diretor (o mesmo que dirigiu Jurassic World, filme muito ruim mas que, ao menos, fez um sucesso financeiro estrondoso) que também escreveria o roteiro, assim como Johnson fizera no segundo filme. Porém, dadas as controvérsias geradas por Johnson em Os Últimos Jedi, JJ Abrams foi chamado para dirigir novamente. Entretanto, diferentemente do que aconteceu no primeiro filme da nova trilogia, Abrams também foi responsável pelo roteiro. Ele acabou escrevendo uma história bastante ruim, esquecível e vagabunda.
Fica a pergunta: para que esses filmes foram feitos?
É claro que quase que a totalidade de todos os filmes são feitos para dar dinheiro, ainda que não existam para serem blockbusters. Mesmo um Central do Brasil quer fazer dinheiro na bilheteria, e quanto mais melhor. É o mesmo com livros, até aqueles que não são escritos com o intuito de se tornarem bestsellers gostariam de poder gerar algum dinheiro. Mas é um tanto óbvio quando um filme ou livro—ainda que sejam feitos explicitamente para serem blockbusters ou bestsellers vagabundos—são criados apenas pelo dinheiro. É perfeitamente possível que um filme seja feito para ser blocksbuster e, ao mesmo tempo, ser um filme bom, dentro da sua proposta boba de blockbuster. Exemplos não faltam ao longo da história do cinema Hollywoodiano: Exterminador do Futuro 2, Jurassic Park e o próprio Guerra nas Estrelas original. O que ficou claro agora com a trilogia nova de Star Wars é que esse não foi o caso: os produtores queriam só ganhar dinheiro mesmo, sem grandes preocupações com uma qualidade mínima. Mas, para piorar, nem mesmo no aspecto financeiro a nova trilogia foi tão boa quanto se esperava. Cada filme fez muito menos do que o filme anterior.
Peguemos os filmes da Marvel Studios, também parte do conglomerado Disney: são filmes pipocão, bobos, feitos para serem blockbusters, assim como os filmes de Star Wars. No entanto, houve um claro planejamento e um esmero para amarrarem os mais de 20 filmes numa conclusão satisfatória—e cada filme ensamble da Marvel Studios, tirando apenas um deles (A Era de Ultron), lucrou muito mais do que o anterior. Quer dizer: cada um dos filmes principais da saga Marvel, tirando um, lucrou bem mais do que o anterior. Ou seja, a Marvel Studios não precisou fazer uma porcaria completa e sem planejamento para lucrar. Já a Lucasfilm fez porcarias sem nenhum tipo de plano e lucrou menos, sucessivamente. Você pode dizer para mim que os filmes da Marvel e da Lucasfilm não são Cidadão Kane ou Chinatown. É verdade, não são mesmo. Cidadão Kane e Chinatown são arte. Filmes da Marvel e da Lucasfilm são—nas palavras de Mr. Plinkett—diarreias comerciais. Mas o ponto é que os filmes da Marvel e os da Lucasfilm são exemplos de como se fazer (e de não fazer) sagas blockbuster: uma delas foi feita com cuidado—em termos de contar uma história coerente, ainda que ridícula—e a outra foi feita nas coxas.
Ao menos, em se falando de Guerra nas Estrelas, ainda temos a trilogia original, que continua muito boa, dentro da sua proposta boba e fantástica.