“E daí?”
Ao ser questionado sobre o que pensava do aumento no número de mortos por coronavírus, Jair respondeu: "E daí? Lamento. Quer que eu faça o quê?" Ele não entende que a pergunta não é um ataque. Não entende que podia aproveitar para dizer que isso é uma tragédia, que tem empatia com os que estão sofrendo e com os que vão sofrer, que serão os mais pobres, como sempre. Mesmo não tendo empatia alguma, e sabemos que ele não tem, podia ao menos fingir. Os deploráveis que o seguem vão dizer que isso é um traço positivo, que ele é sincero. Mentira, ele não é sincero. É apenas um tosco que mal consegue esconder os crimes que cometeu. Mas vamos fingir que ele seja. É um problema ele ser sincero para expressar um tipo de visão de mundo grotesca e irracional. Não faltam exemplos de figuras históricas extremamente sinceras e extremamente grotescas que causaram grandes estragos. Não é preciso dar o exemplo mais óbvio de todos a esta altura do campeonato. Seria bom se a maioria de nós tivéssemos identificado isso nas eleições de 2018, mas não foi o que aconteceu.
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Os deploráveis do Jair acham que as favelas do Rio e de São Paulo existem porque os pobres fizeram escolhas ruins e acabaram ali. Eles acreditam que os pobres merecem ser pobres. Não entendem que muitos dos países ricos que eles tanto bajulam (tirando os Estados Unidos, que tem problemas sociais gravíssimos) possuem sociedades que decidiram, há muitas décadas atrás, não permitir uma disparidade tão absurda de renda como a que existe aqui no Brasil. Aliás, até mesmo as elites de vários desses países contribuem para que não haja a barbaridade social que temos, por mais grotescas e exploradoras que essas elites sejam, visto que toda elite sócio-econômica é exploradora.
Reino Unido, Canadá, Alemanha, Japão, Itália, França, etc, dão saneamento básico para toda sua população. Esses países têm educação pública de qualidade para todas as suas crianças e adolescentes. Todos fomentam a pesquisa científica de base — i.e. não investem apenas em "ciência aplicada" para fabricar porcarias de consumo. Todos fomentam a pesquisa na área das humanidades, por mais que os nossos reacionários incultos inventem que não. Afinal, todos esses países valorizam a cultura. Em contrapartida, vejamos o caso do Brasil. Nosso saneamento não chega perto de alcançar toda a população. Nosso fomento à pesquisa é uma piada, independente da área, mesmo nas épocas de "vacas gordas". O nosso povo foi sabotado: ele é mal pago, tem saúde pública sucateada, não tem saneamento básico, não possui educação pública boa e nem sequer pode pagar por educação particular, porque não tem recursos. Acreditar que um povo desses vai conseguir magicamente prosperar é extremamente idiota. No entanto, os deploráveis do Jair acreditam nisso. E aqui não são apenas os bolsonaristas: toda a direita brasileira acredita nessa boçalidade, até mesmo as versões light do Jair.
Para piorar, agora sabemos que as falas e atitudes irresponsáveis do Jair surtiram efeito. As pessoas cada vez mais estão abandonando o isolamento. Muitos fazem isso por acreditarem nele. Outros tantos por não receberem nenhum tipo de auxílio do Estado brasileiro. Vale lembrar que até o FMI — que geralmente é contra a ideia dos governos aumentarem gastos públicos — recomendou que os países gastassem o que fosse necessário nessa emergência. Países com dívidas muito maiores do que a brasileira — como Estados Unidos, Reino Unido, Japão, e outros — estão alocando recursos para combater o surto numa proporção muito maior do que a nossa. Enquanto isso, o governo federal brasileiro prefere o dogma do conservadorismo fiscal do atual ministro da economia. A curva de infecções entre brasileiros só aumenta. O Imperial College de Londres divulgou uma pesquisa mostrando que o Brasil agora é o país que possui a maior taxa de contágio dentre os 48 países mais afetados pelo coronavírus. Lembremos que o governo americano fez pouco caso do risco meses atrás, agora os Estados Unidos se aproximam dos 70 mil mortos. Certamente chegarão a 100 mil, talvez até aos 200 mil, como a equipe liderada pelo médico Anthony Fauci estimou.
Nos Estados Unidos, apesar de Trump falar um monte de besteiras, as autoridades médicas parecem ter maior controle sobre o que informar ao público. Aqui, Luiz Mandetta, que já era um ministro da saúde medíocre, foi demitido por se recusar a mentir descaradamente para o povo brasileiro, contrariando as ordens obscurantistas e genocidas do presidente, que prega o fim do isolamento social. No seu lugar, Jair colocou Nelson Teich, um médico que se formou em universidade pública mas nunca trabalhou no SUS. Usou sua formação cara, paga com dinheiro de impostos, para lucrar em cima de pacientes ricos. Nas coletivas de imprensa e entrevistas, Teich não fala nada com nada. Não diz diretamente para a população: "faça isso", "não faça isso" e "dado estes gráficos, prevemos isso". Não. Ele enrola. Suas falas são enigmáticas, sem clareza. Enfim, é um péssimo médico. Está contribuindo para a morte de milhares de seres humanos. Porém, o que esperar de mais um deplorável do Jair? Sabemos que eles torcem ativamente para que muitos pobres morram, de preferência pobres pretos e mestiços.
Portanto, em resposta ao presidente, que perguntou "E daí? Quer que eu faça o quê?", escrevo o seguinte: quero que você e os seus deploráveis vão para o quinto dos infernos. Não posso, em sã consciência, dizer que me sentiria mal se Jair, Osmar Terra, Braga Neto, Luciano Hang, Roberto Justus, Junior Durski e companhia, tivessem problemas de saúde. Não há como sentir empatia por essas pessoas. Uma coisa é errar uma vez ou outra, perceber o erro, por mais grotesco que seja, e tentar se redimir de alguma forma. Outra, totalmente diferente, é ativamente fazer do mundo um lugar pior. Todos esses indivíduos que mencionei estão em posições de poder e escolhem usar esse poder para afetar negativamente a vida de centenas de milhões de seres humanos, inclusive a dos meus familiares e amigos. Então, quando eles perguntarem "Quer que eu faça o quê?", a resposta é uma só: queremos que vocês vão para o inferno.