Jesus Woke: Addendum
O texto “Jesus Woke: uma breve análise filosófica a partir de Schopenhauer” é uma análise da ideia de que Jesus seria “woke demais” para determinados fiéis cristãos a partir da filosofia moral de Schopenhauer. Nele, não faço uma análise política, mas uma análise ética. Inclusive, no final do texto, escrevo que Schopenhauer, se voltasse à vida hoje, quase que certamente não se aliaria à esquerda, principalmente aos marxistas — embora ele certamente consideraria os chamados “cristãos conservadores” que acham Jesus woke demais como otimistas e traidores da mensagem cristã original. Mas não adianta explicar isso. Algumas pessoas estão tão inebriadas com a dita “guerra cultural” da política que é impossível para elas se despir disso. Foram condicionadas para dar um coice sempre que acreditam sentir o que consideram ser o cheiro de esquerdismo.
Há uma óbvia desconexão entre o que essas pessoas entendem como pessimismo filosófico de Schopenhauer e o que ele realmente é. Elas estão mais próximas de uma interpretação reacionária de Nietzsche do que de uma análise objetiva de Schopenhauer. Pessimismo, para elas, é apostar no péssimo em absolutamente tudo, é inclusive se refestelar nas piores coisas. Mas Schopenhauer não usa os termos pessimismo/pessimista e otimismo/otimista dessa forma. Uma filosofia ou religião pessimista, para Schopenhauer, é aquela que reconhece que todos nós partilhamos da mesma essência, portanto não há diferença entre o sofrimento do outro e o meu. Isso, para Schopenhauer, deve nos fazer ter compaixão para com o outro e ajudá-lo, deve nos fazer querer diminuir o sofrimento o máximo possível. Percebe-se que a própria existência é sofrimento e que, no final de tudo, o melhor é negar a nossa vontade. Essa negação da vontade em si mesmo implica em ainda mais doação aos outros, com o objetivo de aliviar o seu sofrimento. Mas, para o idiota que não entende nada de filosofia, isso é “esquerdismo” e “utopia”.
Para Schopenhauer, filosofias e religiões otimistas são o oposto do que essas pessoas acreditam ser: filosofias e religiões otimistas afirmam a vontade, não dos outros, mas a própria, visto que a vontade se individua na existência. A vontade é egoísta e devora a si mesma na forma de incontáveis fenômenos individuais. Na filosofia pessimista de Schopenhauer, não ligar para o sofrimento dos outros e buscar somente a satisfação pessoal em detrimento dos outros é afirmar a própria vontade, é ser otimista. Essa postura, novamente, está mais de acordo como uma interpretação reacionária da filosofia Nietzscheana, que não apenas se recusa a julgar a existência, mas de fato a afirma e venera, além de se refestelar nos seus aspectos mais egoístas e grotescos. Para Nietzsche, a ética de Schopenhauer é uma ética cristã, dos fracos, que impede os fortes de realizar aquilo que é seu por natureza.
Essas pessoas não entendem nada do que falam. Algumas, inclusive, ressentem o diagnóstico óbvio que faço, sobre elas só se dizem pessimistas para poder dar um ar intelectual às suas posições políticas “de direita”. Dizem ignorâncias como, por exemplo: “pessimismo não pode ser de esquerda, porque esquerda significa fé na humanidade, na existência, etc”. Aprenderam a dizer essas platitudes vazias assistindo gurus charlatões e não se preocupam em sentar a bunda numa cadeira e ler durante anos. Desconhecem Philipp Mainländer, por exemplo. Mas nem precisamos ir tão longe, já que Mainländer era explicitamente político em grande parte de suas análises, além de tomar partido (o da esquerda), coisa que Schopenhauer jamais fez.
Não precisamos ir até Mainländer, que era pessimista e socialista, para provar que tais pessoas não fazem a menor ideia do que estão falando. Em diversos textos meus, citei passagens de Schopenhauer que resumem a sua filosofia moral, apenas para ser criticado e chamado de “esquerdista” da mesma forma. Ou seja, na cabeça do imbecil que enxerga esquerdismo em tudo, até a filosofia moral de Schopenhauer é esquerdista, utópica, etc, muito embora Schopenhauer desdenhasse da política e suas questões. O burro não sabe, então só sobra para ele repetir mecanicamente, como um robô, a fórmula idiota que decorou de seus ídolos trambiqueiros.
por Fernando Olszewski